Por Elisangela Bitencourt e Julia Cristina Reinehr.
O Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação – ITCMD é um tributo de competência estadual que incide sobre a transmissão de bens ou direitos em decorrência de doação voluntária ou pelo falecimento. Desde 1992, a alíquota máxima do imposto é limitada a 8%, conforme a Resolução n.º 09 do Senado Federal. Já o Imposto de Transmissão de Bens Imóveis Inter Vivos – ITBI é um imposto municipal que incide sobre a transmissão de bens imóveis entre pessoas vivas. Ambos os impostos estão disciplinados na Constituição Federal.
Com a aprovação da Reforma Tributária, que tratou sobre o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e à definição de diretrizes para tributos como o ITCMD (Emenda Constitucional nº 132/2023), os Estados foram encarregados de elaborar parte do texto legislativo infraconstitucional relacionado ao ITCMD. Em paralelo a esta fase, passou-se a discutir também questões relacionadas ao ITBI visando a alteração da lei federal quanto ao tema.
No mês de junho, foi apresentado à Câmara dos Deputados o Projeto de Lei Complementar nº 108/2024 (PLC nº 108/2024), visando regulamentar aspectos da Reforma Tributária ainda não tratados em outros projetos de lei. Foi tratado basicamente sobre quatro grandes temas: (i) o Comitê Gestor, o processo administrativo tributário do IBS, as disposições relativas à transição do ICMS e ICMS-ST e alterações nas regulamentações do ITCMD e do ITBI.
A regulamentação dos aspectos relacionados ao IBS e à transição do ICMS já era prevista. No entanto, as mudanças referentes ao ITCMD e ao ITBI, que buscam atender às demandas dos Estados e Municípios, foram além do que era antecipado pela Emenda Constitucional – EC nº 132/2023.
Em Minas Gerais, em junho deste ano, o assessor da Secretaria da Fazenda anunciou, durante uma coletiva de imprensa, que o projeto de lei regulamentando a reforma tributária, foi realizado, amparado por um estudo técnico elaborado conjuntamente pelos governos estaduais que aponta a necessidade de elevar a alíquota do ITCMD para até 21%. Tal estudo considerou que, em países como Inglaterra, Austrália, Noruega, Alemanha e Japão, a alíquota do ITCMD pode variar entre 40% a 50%, enquanto no Brasil está limitada a 8%.
Apesar da recomendação técnica, os representantes dos governos estaduais decidiram não incluir essa questão no Projeto de Lei Complementar nº 108/2024, deixando a decisão final a cargo do Senado Federal, trazendo para o texto legal alguns pontos a mais que o tratado na EC nº 132/2023. Segundo o assessor da Secretaria da Fazenda dos Estados e do Distrito Federal, ainda não há uma definição sobre a possibilidade de solicitar ao Senado o aumento da alíquota, embora, pelo contexto do que está sendo abordado, deduz-se que há uma expectativa de elevar substancialmente a alíquota do imposto.
Entre as principais novidades relativas à regulamentação do ITCMD trazidas pelo PLP nº 108/2024, destacam-se a ampliação do conceito de doação, incluindo transmissões entre pessoas vinculadas e atos societários sem justificativa negocial; a definição de que o ITCMD não incide na extinção de usufruto; a exclusão de contratos de risco do conceito de transmissão causa mortis; a previsão de incidência do imposto sobre Trusts e fidúcia; a base de cálculo para ações e quotas não negociadas em mercado de capitais, que deve corresponder ao valor patrimonial ajustado ao valor de mercado; a permissão para dedução de dívidas comprovadas do falecido; a introdução de conceitos de domicílio para pessoas físicas e jurídicas; a obrigação de reporte semestral pelos Tribunais de Justiça às administrações tributárias estaduais sobre processos de inventário e doação; a definição do prazo de decadência contado a partir do conhecimento do ato ou da entrega da declaração; e a retenção do ITCMD por instituições financeiras em casos de transmissão causa mortis ou doação de bens sob sua administração.
No que diz respeito ao ITBI, o referido PLP nº 108/2024, traz regramento específico, alterando o Código Tributário Nacional, para considerar o fato gerador do ITBI no momento da celebração do ato de transmissão ou do título translativo do bem imóvel ou do direito real sobre bem imóvel. Além disso, o projeto prevê a possibilidade dos Municípios e o Distrito Federal realizarem a cobrança do tributo na assinatura da escritura, antes da transferência, e estabelece que o valor venal a ser considerado como base de cálculo deve ser o valor de referência anual ou o valor da transmissão, o que for maior.
Todavia, atualmente, o momento da incidência do ITBI ainda gera controvérsia, diante das interpretações divergentes entre os municípios e os tribunais superiores e, por mais que o PLP nº 108/2024 pretenda resolver essa questão, existe a possibilidade da manutenção se perpetuar, diante da dualidade de ocasiões passíveis de incidência.
Nota-se que o PLP nº 108/2024 foi além da simples regulamentação dos pontos abordados na EC nº 132/2023. A formalização de diversos aspectos que anteriormente favoreciam os contribuintes devido à falta de legislação específica, agora reforça a importância do planejamento sucessório. Nesse contexto, o planejamento sucessório se mostra a melhor e mais adequada ferramenta para organizar e transmitir o patrimônio em vida, pois permite a distribuição dos bens conforme a vontade do titular, reduzindo conflitos familiares e o embaraço de bens. Além disso, possibilita o fracionamento do pagamento do ITCMD, permitindo que o tributo incida sobre a totalidade do patrimônio em momentos diferentes, conforme a preferência do sucedido.
A Cassuli Advocacia e Consultoria acompanhará todos os desdobramentos sobre o assunto, com o objetivo de manter informados os contribuintes e interessados.