Por Ana Flavia Berri. | Publicado em 04/12/2024.
O uso indevido de marca é um tema central no direito de propriedade industrial, especialmente quando envolve questões relacionadas ao uso prolongado de um sinal distintivo por uma empresa e a posterior contestação de sua utilização por outra empresa que obteve o registro da marca.
Em recente decisão, a 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) analisou um caso de uso indevido de marca entre duas pizzarias, uma localizada em Sorocaba e outra na capital paulista. A pizzaria de Sorocaba utilizava a marca de 1994, por meio de um contrato de franquia com o titular original do registro, e continuou a utilizá-la após a extinção do registro da franqueadora em 2013, pagando taxas de royalties e demais obrigações contratuais. Já a pizzaria de São Paulo, autora da ação, obteve o registro da marca somente em 2016, mas se manteve inerte por 6 anos após ter ciência do uso da marca pela pizzaria de Sorocaba em 2017.
A decisão do TJSP foi unânime, favorável à pizzaria de Sorocaba. O relator ressaltou o uso prolongado e de boa-fé da marca por quase 30 anos, a inércia da autora em contestar a utilização da marca durante esse período e a distância geográfica significativa entre os dois estabelecimentos, que atuavam para públicos-alvo distintos. Sem qualquer demonstração de prejuízo pela pizzaria de São Paulo, a jurisprudência aplicável envolveu, ainda, a análise de ausência de risco de confusão entre os consumidores, o que, ao fim, resultou na admissão da convivência pacífica das marcas, afastando qualquer condenação à pizzaria de Sorocaba.
Da decisão notou-se o entendimento de que o uso prolongado de uma marca pode gerar, para o detentor da marca, o que se conhece como “direito adquirido”, mesmo que o registro da marca tenha sido extinto ou o titular do registro tenha sido alterado. Esse conceito foi diretamente relacionado ao princípio da boa-fé, que é um elemento essencial para a avaliação da situação. A boa-fé, em geral, permite que o uso contínuo e ininterrupto de um sinal distintivo seja considerado legítimo, principalmente quando este uso ocorre sem contestação por um longo período.
No caso específico das pizzarias, o fato do estabelecimento de Sorocaba ter utilizado a marca de forma ininterrupta desde 1994 e não ter sido desafiada por mais de 6 anos após a autora ter obtido o registro e ter ciência da existência da concorrente, evidencia o conceito de boa-fé e o direito de continuar com a utilização do sinal distintivo, já que a proteção de uma marca deve ser exercida com diligência, e não com espera passiva, o que fortalece a argumentação de que a convivência entre as marcas era possível.
Embora o tema ainda gere debates e nem todos os tribunais superiores adotem este posicionamento, o acórdão prolatado pela Câmara supramencionada pode ser considerado um precedente relevante, inclusive para casos mais complexos, em que haja confusão de mercado ou prejuízo comprovado, de modo que a decisão reforça a importância de buscar um equilíbrio entre os direitos do titular do registro e os direitos adquiridos por meio do uso contínuo e de boa-fé de um sinal distintivo. Assim, pode-se argumentar que, mesmo diante de confusão ou prejuízo, a proporcionalidade deve ser observada, levando em conta o contexto das partes envolvidas, permitindo estimular relações de mercado mais harmoniosas, protegendo a inovação e a concorrência justa, sem desconsiderar as peculiaridades de cada caso.
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