Por Emilli Fátima Haskel da Silva.
A Emenda Constitucional n. 123/2023, que figura hoje como o pontapé inicial da Reforma Tributária, trouxe inovações jurídicas para além da tributação sobre o consumo, tratando de questões pertinentes também à tributação do patrimônio. Exemplo disso é o alargamento das hipóteses de incidência do IPVA, imposto este que até então não incidia sobre a propriedade de aeronaves e embarcações.
Decisões do Supremo Tribunal Federal anteriores à Reforma Tributária afirmavam que a cobrança de IPVA sobre aeronaves e embarcações era inconstitucional, pois o IPVA então previsto na Constituição Federal sucedeu o que antes era a Taxa Rodoviária Única – TRU, esta que se direcionava exclusivamente à tributação da propriedade de veículos terrestres. Por uma interpretação que levava em consideração a vontade do legislador ao instituir o IPVA, o STF então havia compreendido pela sua não incidência sobre as aeronaves e embarcações.
Apesar disso, alguns estados chegaram a tentar realizar a referida exigência tributária. Na própria Lei n. 7.543/1998 do Estado de Santa Catarina, por exemplo, há a previsão da propriedade de embarcações e aeronaves como hipótese de incidência do IPVA, porém a autoridade tributária vinha se abstendo da cobrança, dado o entendimento do STF.
Em razão de um senso de “justiça fiscal”, há muito já se vinha falando em tributação das aeronaves e embarcações, o que ensejou propostas de projetos de lei como o PLP 226/2016 e PLP 159/2019, que buscavam a instituição de um “IPAE” – Imposto sobre a Propriedade de Aeronaves e Embarcações, porém tais projetos nunca foram de fato aprovados.
Apesar da não aprovação dos projetos de lei, a própria Reforma Tributária inseriu no texto da Constituição Federal a possibilidade de se cobrar IPVA sobre a propriedade de aeronaves embarcações, então o que antes não era considerada uma vontade do legislador constituinte – conforme entendia o STF –, agora passou a ser.
O questionamento principal que se tem feito é se essa espécie de IPVA poderia já ser cobrada no decorrer do ano de 2024, e o nosso entendimento é de que não, não poderia. Isso se dá por três motivos principais: (1) tal tributo precisará ser regulamentado por intermédio de lei própria, a qual deverá prever seu fato gerador, base de cálculo, alíquota aplicável etc.; (2) é obrigatória a observância das anterioridades anual e nonagesimal, as quais orientam que novos tributos ou tributos que foram majorados apenas podem ser cobrados no ano seguinte do qual foram instituídos ou aumentados e após transcorridos 90 dias; (3) não é possível a convalidação das leis já existentes antes reconhecidas inconstitucionais, uma vez que não se admite a “constitucionalidade superveniente”.
Dessa forma, se qualquer dos estados da federação tentar realizar a cobrança do IPVA sobre as aeronaves e embarcações ainda no ano de 2024, o contribuinte poderá buscar os meios administrativos e/ou judiciais para afastar tal exigência indevida.
A CASSULI ADVOCACIA E CONSULTORIA acompanhará de perto os desdobramentos envolvendo o assunto, contando com profissionais capacitados para oferecer o suporte necessário ao tema apresentado.