Por Micaela Day da Silva.
O início do segundo semestre de 2023 trouxe consigo um foco do Poder Legislativo sobre a ampla pauta econômica e tributária do Governo Federal. Nesse cenário, a aprovação, ao menos em primeiro turno, da Reforma Tributária (PEC nº 45/2019) ganha especial destaque, sendo a principal prioridade da Câmara dos Deputados nesta semana.
Cabem, então, algumas considerações sobre o tema.
A atual proposta de Emenda Constitucional a ser votada contempla, em resumo, a adoção de um Sistema Tributário “dual”, dividido entre uma Contribuição sobre Bens e Serviços – CBS, a cargo da União, e um Imposto sobre Bens e Serviços – IBS, do qual ficariam encarregados, simultaneamente, Estados e Municípios.
Ambos seriam arrecadados no destino (local de consumo), possuindo características estruturais muito próximas em termos de fato gerador, base de cálculo e sujeição passiva.
Prevê-se, ainda, um Imposto Seletivo – IS, específico para bens e serviços considerados “prejudiciais” à saúde e/ou ao meio ambiente, além de modificações pontuais no IPTU, no IPVA e no ITCMD.
O texto, contudo, acaba dando origem a disfunções e entraves que, na prática, violam a Constituição. Há, por exemplo, uma concentração de poder nas mãos da União, responsável por instituir, por Lei Complementar ou Ordinária, a CBS e o IBS, cabendo aos Estados e Municípios legislar apenas sobre “questões instrumentais”.
A estruturação das alíquotas desses tributos também se mostra inadequada, uma vez que a alíquota intermediária prevista será, sozinha, superior à tributação padrão praticada por inúmeros países, especialmente no que diz respeito a itens de saúde, educação e da cesta básica.
Por fim, as disposições que tratam do IS requerem, de pronto, ajustes para fins de melhor definição do escopo desse imposto, evitando que se transforme em apenas mais uma ferramenta de arrecadação para os cofres da Fazenda Nacional.
Ao longo dos anos, o Sistema Tributário brasileiro sofreu uma deterioração profunda, causada por fatores como complexidade excessiva e insegurança jurídica. Assim, é justificável que se busque uma “reforma” para fins de modernização e correção de incongruências. Todavia, qualquer alteração pretendida deve, necessariamente, observar as bases sobre as quais se organizam as ordens jurídica e socioeconômica do país, sobretudo o Estado federativo e a repartição de competências entre seus Entes, de modo a assegurar que eventual aprovação se dê com a responsabilidade que o tema exige.